siiclogo2c.gif (4671 bytes)
ASPECTOS GENÉTICOS DA SUSCETIBILIDADE DO HOSPEDEIRO À HANSENÍASE
(especial para SIIC © Derechos reservados)
tavoramira9_91410.jpg
Autor:
Marcelo Távora Mira
Columnista Experto de SIIC

Institución:
Pontifïcia Universidade Católica do Paraná

Artículos publicados por Marcelo Távora Mira 
Coautores Angela Schneider Francio* Renata Helena Monteiro Sindeaux** Vinicius Medeiros Fava*** Geovana Brotto Ramos**** Vanessa Santos Sotomaior***** 
Candidata a mestrado, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil*
Especialista, candidata a doutorado, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil**
Graduado, candidato a doutorado, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil***
Graduada, candidata a mestrado, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil****
Doutora, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, Brasil*****


Recepción del artículo: 10 de agosto, 2010
Aprobación: 20 de octubre, 2010
Conclusión breve
Esta revisão oferece uma síntese dos últimos avanços obtidos na área a partir de estudos genéticos epidemiológicos e funcionais.

Resumen

Hanseníase é uma doença infecciosa crônica que ainda afeta aproximadamente 215 000 pessoas em todo o mundo. Observações clínicas e epidemiológicas sugerem que apenas uma pequena parcela de indivíduos expostos ao Mycobacterium leprae desenvolvem a doença. Hoje, sabe-se que mecanismos de controle da suscetibilidade a fenótipos da doença dependem, em grande parte, das características genéticas do hospedeiro. Esta revisão oferece uma síntese dos últimos avanços obtidos na área a partir de estudos genéticos epidemiológicos e funcionais.

Palabras clave
hanseníase, formas clínicas, estados reacionais, estudos funcionais, genética do hospedeiro, polimorfismos

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/111070

Especialidades
Principal: DermatologíaInfectología
Relacionadas: Anatomía PatológicaAtención PrimariaDiagnóstico por LaboratorioEpidemiologíaGenética HumanaMedicina InternaSalud Pública

Enviar correspondencia a:
Marcelo Távora Mira, Pontifïcia Universidade Católica do Paraná, 80.215-901, Curitiba, Brasil


Host Genetics and Susceptibility to Leprosy

Abstract
Leprosy is a chronicle infectious disease that still affects approximately 215 000 individuals worldwide. Clinical and epidemiological observations suggest that only a small proportion of the population exposed to Mycobacterium leprae develop the disease. Today, it is known that mechanisms controlling susceptibility to leprosy phenotypes strongly depend on the genetic background of the host. This review summarizes the latest advances in the field, obtained from genetic epidemiology and functional studies.


Key words
leprosy, leprosy clinical forms, leprosy reactions, functional studies, host genetics, polymorphisms


ASPECTOS GENÉTICOS DA SUSCETIBILIDADE DO HOSPEDEIRO À HANSENÍASE

(especial para SIIC © Derechos reservados)
Artículo completo
Fatores de risco genéticos de suscetibilidade à hanseníase e suas formas clínicas

A hanseníase é uma doença infecciosa crônica, causada pelo Mycobacterium leprae, que acomete principalmente pele e nervos periféricos. A doença, também conhecida como lepra, tem sido um problema de saúde ancestral para populações humanas, e apesar disso, muito pouco ainda se conhece sobre suas bases fisiopatológicas e epidemiológicas. Atualmente, a hanseníase ainda afeta cerca de 215 000 indivíduos em todo mundo, com a maioria dos novos casos concentrados no Brasil e na India.1 A doença apresenta um amplo espectro de manifestações clínicas que varia de acordo com a resposta imune do hospedeiro. Em um pólo desse espectro está a forma lepromatosa, sistêmica, associada com uma resposta imunológica do tipo Th2 (humoral) e no outro, a forma tuberculóide, localizada e associada com forte resposta imune do tipo Th1 (celular).2

Com a identificação do bacilo causador da hanseníase no século XVII por Armauer Hansen,3 confirmou-se sua natureza infecciosa e muito da investigação científica passou a se concentrar em aspectos relativos ao agente patogênico e suas propriedades, tais como virulência, capacidade de indução de resposta imune e resposta ao tratamento. Contudo, observações clínicas sempre indicaram que o controle da suscetibilidade a diferentes fenótipos da doença depende de características inatas ao hospedeiro, associadas a fatores ambientais e sócio-econômicos.4 Por exemplo, a influência de fatores genéticos no controle da hanseníase per se (a doença independentemente de sua forma clínica) e suas formas de manifestação clínica têm sido demonstrada em estudos de agregação familial, estudos em gêmeos, análises de segregação complexa e análises de associação e ligação.5

Em 1988, foi realizada análise de segregação complexa em uma população da ilha caribenha Desirade. A prevalência de hanseníase na ilha era de aproximadamente 30/1 000 habitantes, uma das mais elevadas do mundo na ocasião. Os resultados do estudo rejeitaram um modelo esporádico (não familial) e indicaram uma herança mendeliana, com um gene principal co-dominante ou recessivo controlando a suscetibilidade à doença.6 Mais recentemente, esse achado foi em parte confirmado em estudo realizado por nosso grupo, envolvendo 76 pedigrees correspondentes à totalidade de uma população isolada e hiperendêmica (128.2/1 000 hab.) para hanseníase localizada no Pará, norte do Brasil, que também resultou na rejeição de modelo predominantemente ambiental de controle da suscetibilidade à doença.7 Importante, este estudo revelou que o efeito de gene principal encontrado foi capaz de explicar integralmente a agregação familial de casos, independentemente do compartilhamento, em uma mesma família, de variáveis não-genéticas.

Embora eficientes em indicar a existência de um controle genético da suscetibilidade à hanseníase, estes estudos observacionais são limitados em seu poder de definir a exata natureza deste efeito, como por exemplo, o número e a identidade dos genes envolvidos. Para tal, estudos genético-moleculares são necessários, e vários têm sido realizados ao longo das últimas décadas (5). Como resultado, diversos genes, tais como o VDR,8 NRAMP1,9 TAP,10 IL1011 e variantes da região MHC/HLA12 foram identificados em associação ou ligação com fenótipos da hanseníase.

Em 2001, uma primeira varredura genômica para genes de suscetibilidade à hanseníase encontrou evidência de ligação entre a região cromossômica 10p13 e hanseníase paucibacilar em uma população da India.13 O achado foi confirmado, dois anos mais tarde, em uma coleção de famílias recrutadas no Vietnam do Sul.15 Recentemente, uma análise realizada em uma amostra da mesma população vietnamita mostrou associação significativa entre marcadores do gene MRC1, localizado na região 10p13, e hanseníase per se.14 Esse resultado argumenta a favor do MRC1 como um gene de suscetibilidade a hanseníase per se; porém, não explica o pico de ligação observado nos estudos de ligação anteriores, exclusivo para famílias contendo indivíduos portadores da forma paucibacilar da doença. Até o momento, nenhum gene candidato emergiu de estudos envolvendo a região 10p13 e hanseníase paucibacilar.

O resultado mais importante da varredura genômica realizada na população vietnamita,15 com a participação de nosso grupo, foi a localização de loci de suscetibilidade à hanseníase per se nas regiões cromossômicas 6q25-q27 e 6p21.15,16 Estudos subsequentes, de mapeamento de alta densidade, levaram à identificação de variantes dos genes PARK2/PARCRG16 e LTA,17 respectivamente, como importantes fatores de risco para a doença. Atualmente, um dos focos de nosso trabalho está na completa dissecção do forte efeito de ligação observado entre a região cromossômica 6q25-q27 e hanseníase per se. Nossa expectativa é de que genes candidatos adicionais, localizados neste segmento cromossômico, serão descritos.

Recentemente, uma varredura genômica de associação (Genome-Wide Association, ou GWA), realizada em uma população chinesa identificou variações em sete genes –CCDC122, CD13orf31, NOD2, TNFSF15, HLA-DR, RIPK2 e LRRK2– associados com a suscetibilidade à hanseníase, com resultados mais evidentes para os genes CD13orf31, NOD2, RIPK2 e LRRK2 e hanseníase multibacilar. Na tentativa de replicar esses achados, Wong e col. genotiparam, em uma população africana, os mesmos marcadores associados no estudo chinês. Foi novamente observada associação significativa entre hanseníase e os genes C13orf31 e CCDC122, cujas variantes têm sido descritas como fatores de risco para doença de Crohn. Curiosamente, os achados para os genes NOD2, RIPK2, TNFSF15 e LRRK2 não foram replicados.18 Segundo o pesquisador Dr. Erwin Schurr, da Universidade McGill (Montreal, Canadá), o componente genético de controle da sucetibilidade a infecções em geral é complexo, heterogêneo e modulado por fatores ambientais, como determinantes da virulência microbiana. Porém, estudos do tipo GWA, que combinam o conhecimento da sequência completa do genoma humano com o da arquitetura complexa de suas variantes mais comuns, têm se mostrado uma ferramenta poderosa para se avançar na elucidação destes fatores inatos de resistência.19


Genética dos estados reacionais em hanseníase

Os estados reacionais (ER) acometem cerca de 30%-50% dos pacientes que desenvolvem hanseníase4 e são considerados os maiores causadores de sequelas neurológicas permanentes desde que a poliquimioterapia (PQT) foi implementada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1982. Estudos demonstram que de 16% a 56% dos pacientes apresentam perda ou diminuição de função neural periférica já no diagnóstico de hanseníase,20 em sua grande maioria devido à ocorrência dos ER, já que uma parcela considerável dos diagnósticos de ER são efetuados simultaneamente ao da doença per se. Estudo prospectivo realizado em uma população da India demonstrou que 39.4% de novos casos multibacilares desenvolveram ER e destes, 73% desenvolveram danos neurais previamente inexistentes.21 Os ER ocorrem com maior freqüência durante o tratamento PQT, principalmente no primeiro ano após o diagnóstico,22 mas podem aparecer anos após o término do tratamento, no entanto, com menor freqüência.23

Os mecanismos fisiopatológicos por trás dos ER ainda permanecem obscuros. As hipóteses mais aceitas baseiam-se na ativação de um processo inflamatório de forma repentina e exacerbada nas lesões pré-existentes e/ou em novas lesões, freqüentemente envolvendo nervos periféricos, o que requer tratamento imediato, normalmente com corticóides, a fim de se evitar danos neurais permanentes. Os ER podem ser divididos em dois principais grupos: a reação reversa (RR), ou reação do tipo 1, e o eritema nodoso hansênico (ENH), também conhecido como reação do tipo 2. RR e ENH diferem na forma clínica, porém, podem ocorrer em um mesmo paciente em tempos distintos.24

Diversos estudos evidenciam níveis circulantes aumentados de citocinas Th1, tais como o TNF-α, INF-γ e IL-12, em pacientes no momento do diagnóstico de RR; (rev. em25). Esta observação está de acordo com a hipótese de que a RR é uma reação de hipersensibilidade tardia a antígenos do M. leprae, causada pela reativação da resposta imune celular do tipo Th1. Pacientes que apresentam as formas borderline da doença26 tem maior propensão ao desenvolvimento de RR, provavelmente devido à instabilidade no balanço Th1-Th2. Outros fatores como idade, índice baciloscópico e número de lesões também estão associados à patologia.22 Quanto ao ENH, acredita-se que, por motivo ainda não esclarecido, ocorra a ativação Th1 em pacientes com resposta predominantemente Th2, levando à formação de imunocomplexos que causariam inflamação nas lesões, muitas vezes de repercussão sistêmica. O ENH acomete predominantemente pacientes do pólo lepromatoso da doença,23 em 62.5% destes, de forma crônica.27

Apesar dos sinais e sintomas dos ER serem bem descritos, pouco tem sido explorada e hipótese da existência de fatores genéticos que levam ao desencadeamento do processo. Variações nos genes TLR1 e TLR2 vêm sendo demonstradas associadas à ER. A família de receptores TLR1, 2 e 6, envolvidos na resposta imune inata, é formada por dímeros responsáveis pelo reconhecimento de antígenos, principalmente de micobactérias.28 Estudo realizado em uma amostra populacional etíope formada por 66 casos de RR e 150 controles demonstrou associação do single nucleotide polymorphism (SNP) TLR2 rs3804099 com proteção [OR = 0.34 (0.17-0.68) p = 0.002] e um microssatélite próximo ao gene com susceptibilidade à RR [OR = 5.83 (1.98-17.15) p = 0.001].29

Dois SNPs não-sinônimos presentes no gene TLR1 foram descritos associados a ER: o SNP rs5743618 (I602S) foi encontrado associado com proteção à RR [OR = 0.51 (0.29-0.87) p = 0.01] em uma população do Nepal de 206 casos de RR e 603 controles;30 o SNP rs4833095 (N248S) está associado com ENH em uma população de Bangladesh de 656 controles e apenas 11 casos de ENL [OR = 0.40 (0.16-0.99)].31

Recentemente, sete dos polimorfismos do gene NOD2 investigados na mesma população nepalense utilizada no estudo do gene TLR1 foram demonstrados associados a RR e ENL, o de maior significância para RR foi o rs8044354 [OR = 0.74 (0.59-0.92) p = 0.005] e para ENL, o rs2287195 [OR = não demonstrado; p = 0.006].32

Apesar dos primeiros estudos sugerindo um controle genético em ER, há muito ainda a ser explorado. São de suma importância novas pesquisas com o intuito de elucidar o mecanismo de ação dos ER, pois mesmo em um cenário de eliminação da hanseníase, previsto pela OMS mas vista com ceticismo por muitos especialistas,33 os ER continuarão a ser um grave problema de saúde pública. Portanto, a descrição de marcadores preditivos dos ER é um dos maiores desafios em hanseníase na atualidade. Estudos funcionais, por exemplo, podem ser uma boa ferramenta para contribuir na escolha de genes e vias candidatas à susceptibilidade a ER. Em publicação recente, o grupo liderado pela Dra. Mariane Stefani, da Universidade Federal de Goiás, Brasil, comprovou alterações, previamente descritas,34 nos níveis de expressão de diversas citocinas e quimiocinas, tanto na RR1 quanto no ENH.35 Genes de citocinas são bons candidatos funcionais, e vários deles estão em fase avançada de investigação, em nosso laboratório, como possíveis marcadores gênicos de risco de desenvolvimento de ER.


Genética funcional da suscetibilidade à hanseníase

Entre as diversas estratégias possíveis para investigação dos mecanismos moleculares envolvidos na patogênese da hanseníase, estudos genéticos em larga escala têm produzido resultados promissores. Contudo, para maioria desses genes, pouco se sabe sobre suas funções no contexto da infecção por M. leprae. Genes candidatos, como IL10, TNFA, LTA, MRC1 e PARK2, vêm sendo alvo de análises funcionais cujo objetivo é entender melhor seus papéis biológicos na fisiopatologia da doença.

O gene IL10 codifica uma citocina imunorregulatória primariamente excretada por macrófagos ativados e células T reguladoras, envolvidas no controle da imunidade inata e imunidade mediada por células, respectivamente. Análises haplotípicas ultilizando SNPs localizados na região promotora desse gene,11,36 bem como estudo posterior caso-controle e de meta-análise, revelaram que o alelo -819T está associado com suscetibilidade à hanseníase. Consistentemente, dosagem de IL-10 em sobrenadantes de células mononucleares de sangue periférico de indivíduos carreadores do alelo -819T, estimuladas com antígenos de M. leprae, revelou menor produção da citocina quando comparado com células com o genótipo -819C.37

O TNF-α, codificado pelo gene TNFA, é uma citocina principalmente produzida por monócitos/macrófagos que, diferente da IL-10, tem atividade pró-inflamatória, efetora da resposta imune inata. Na hanseníase, o TNF-α parece estar envolvido no controle da resistência do hospedeiro ao M. leprae. Estudo baseado em famílias38 e estudos subsequentes caso-controle39,40 sugerem que o alelo -308A da região promotora do gene TNFA promove proteção contra hanseníase per se. Contudo, outros achados divergem desse resultado, e mostram o alelo -308A associado com forte resposta inflamatória contra M. leprae41 e com suscetibilidade à forma multibacilar da infecção.42 Estudo funcional indicou que portadores do alelo -308A apresentavam uma forte reação inflamatória contra antígenos do M. leprae em pele. Ainda, dosagens de TNF-α em sobrenadante de células isoladas de biópsias de pele revelaram que pacientes classificados na forma tuberculóide expressam mais essa citocina.43 Outro estudo funcional recente demonstrou que camundongos knouckout TNF/ possuem menor capacidade de controlar a infecção por M. leprae, já que foi observado significativo aumento no número de bacilos durante nove meses de acompanhamento a partir da inoculação do microrganismo em suas patas.44 Tais achados revelam um envolvimento importante do TNF-α na patogênese da hanseníase; porém, o papel exato da variação -308 ainda permanece obscuro.

Outra citocina envolvida na hanseníase, a linfotoxina alfa (LT-a) é um membro da superfamília do TNF. A função da LT-a, codificada pelo gene LTA, é menos conhecida em comparação com o TNF-a. Sabe-se que é uma citocina participante na ativação de inflamação crônica, através da regulação da expressão de moléculas de adesão, bem como de outras citocinas e quimicionas importantes no recrutamento de linfócitos45 e na resposta contra patógenos intracelulares.46 Alcaïs e col. relacionaram o SNP LTA+80 com maior risco à hanseníase, principalmente em populações de casos jovens.17 O papel biológico deste SNP já havia sido testado in vitro em linhagens de células B, transfectadas para expressar os alelos LTA +80A ou LTA +80C, revelando que o primeiro é capaz de suprimir a expressão de LT-a. Outro estudo com camundongos knouckout LT-a/ infectados com M. leprae mostrou uma diminuição na ativação de células T, consequentemente uma menor resposta inflamatória na fase crônica da infecção.44

Mais recentemente, estudos buscaram entender o papel biológico do gene MRC1 na hanseníase. Esse gene codifica um receptor de manose (RM), membro da família dos receptores de superfície celular de lectina tipo-1 em humanos. Apesar dos RMs não serem receptores intermediários da fagocitose, são expressos em células especializadas, como macrófagos e células dendríticas. Esses receptores são capazes de reconhecer e se ligar a padrões moleculares associados a patógenos (pathogen-associated molecular patterns - PAMPs), como resíduos de manose, fucose e N-acetil-glucosamina,47,48 evento chave no desencadeamento da resposta imune inata. Alter e col.14 analisaram polimorfismos do éxon 7 do gene MRC1 em amostras de famílias de indivíduos afetados por hanseníase do Vietnam e em amostras caso-controle do Brasil. Os achados revelaram o haplótipo G396-A399-F407 associado a hanseníase per se e à doença multibacilar. Já o haplótipo S396-A399-F407 apareceu com maior frequência no grupo controle. Os mesmos pesquisadores partiram em seguida para uma abordagem funcional, realizando ensaios de associação com células recombinantes construídas para super-expressar os haplótipos citados anteriormente. Após ensaios celulares com ligantes clássicos de MR (ovoalbumina e zimosan) e ainda com M. leprae e B. bovis BCG, não verificou-se diferenças significativas entre as variantes em relação a capacidade celular de ligação e internalização. Esses achados funcionais sugerem que o efeito desses haplótipos possa ser indireto, e que o processo de internalização do M. leprae ou de outros patógenos dependa de outras moléculas, além dos MRs.

Um dos genes de grande interesse do nosso grupo é o PARK2, associado ao controle da suscetibilidade à hanseníase per se.16 O gene PARK2 codifica uma enzima altamente conservada denominada parquina, uma ubiquitina ligase (E3) de 465 aminoácidos e 52-kDa.49,50 A parquina é expressa em vários tecidos e tipos celulares, incluindo os neurônios dopaminérgicos presentes na substantia nigra do mesencéfalo e células de Schwann do sistema nervoso periférico.16,52 Por ser uma E3, a parquina classicamente é responsável pela ubiquitinação de proteínas-alvo, dirigindo-as para degradação no proteassomo.49,50 A ubiquitinação de proteínas, além de sinalizar para a degradação, regula diversos processos celulares, como reparo de DNA recém-replicado, endocitose, tráfego de proteínas, degradação lisossomal, apoptose, apresentação de antígeno e transcrição.53,54 Estudos recentes utilizando diferentes modelos celulares e animais mostram que a parquina é uma proteína multifuncional, e destacam seu papel na regulação da integridade mitocondrial frente ao estresse oxidativo e fosforilação oxidativa. Variantes do gene PARK2 são capazes que elevar o estresse oxidativo, conseqüentemente causando danos celulares indiretos e até morte celular.55,56

Não se sabe quais as conseqüências biológicas da presença de variações genéticas no gene PARK2 sobre o funcionamento das células em geral, e das células-alvo do M. leprae em particular. Indiretamente, a inibição do proteassomo de macrófagos infectados com M. leprae reduz o índice de apoptose celular, além de alterar o perfil de produção de certas citocinas.57 É possível que variações no gene PARK2 alteram a função normal dos macrófagos, modificando sua resposta frente ao desafio com antígenos do M. leprae. Este efeito poderia ser específico ao M. leprae, ou pode ser comum a outros microorganismos patogênicos. Estudo genético independente demonstrou associação entre aqueles polimorfismos de PARK2/PACRG encontrados primeiramente nos estudos com hanseníase e a febre tifóide e paratifóide, infecções causadas pelos patógenos intracelulares Salmonella typhi e Salmonella paratyphi, respectivamente.58 Em nosso grupo, macrófagos primários contendo mutações no gene PARK2, e linhagens monocíticas transfectadas com RNAs de interferência para este gene vêm sendo desafiados com M. leprae; em seguida, ensaios funcionais são aplicados, com o objetivo de se avançar no entendimento da função da proteína parquina na resposta imunológica do hospedeiro frente ao patógeno.


Considerações finais

Ao longo dos últimos anos, um sólido corpo de evidências acumulou-se em favor de um papel crucial da genética do hospedeiro no controle da suscetibilidade à hanseníase. Porém, esses estudos não explicam na totalidade porque certos indivíduos adoecem com mais facilidade, progridem para diferentes formas clínicas da doença ou desenvolvem episódios reacionais. A combinação de estudos genéticos e funcionais pode ser uma poderosa ferramenta na dissecção de vias metabólicas envolvidas na fisiopatologia da doença. Além disso os conhecimentos produzidos podem ter impacto direto sobre a saúde do paciente na forma de melhores estratégias de prevenção, diagnóstico e tratamento.
Bibliografía del artículo


1. Leprosy fact sheet (revised in February 2010). Wkly Epidemiol Rec 85(6):46-8, 2009.
2. Ridley DS, Jopling WH. Classification of leprosy according to immunity. A five-group system. Int J Lepr Other Mycobact Dis 34(3):255-73, 1966.
3. Hansen GA. Spedalskhedens Arsager. Norsk Magazin for Laegevidenskaben 1874 1955:76-9.
4. Scollard DM, Adams LB, Gillis TP, Krahenbuhl JL, Truman RW, Williams DL. The continuing challenges of leprosy. Clin Microbiol Rev 19(2):338-81, 2006.
5. Mira MT. Genetic host resistance and susceptibility to leprosy. Microbes Infect 8(4):1124-31, 2006.
6. Abel L, Demenais F. Detection of major genes for susceptibility to leprosy and its subtypes in a Caribbean island: Desirade island. Am J Hum Genet 42(2):256-66, 1988.
7. Lazaro FP, Werneck RI, Mackert CC, Cobat A, Prevedello FC, Pimentel RP, et al. A major gene controls leprosy susceptibility in a hyperendemic isolated population from north of Brazil. J Infect Dis 201(10):1598-605.
8. Roy S, Frodsham A, Saha B, Hazra SK, Mascie-Taylor CG, Hill AV. Association of vitamin D receptor genotype with leprosy type. J Infect Dis 179(1):187-91, 1999.
9. Meisner SJ, Mucklow S, Warner G, Sow SO, Lienhardt C, Hill AV. Association of NRAMP1 polymorphism with leprosy type but not susceptibility to leprosy per se in west Africans. Am J Trop Med Hyg 65(6):733-5, 2001.
10. Rajalingam R, Singal DP, Mehra NK. Transporter associated with antigen-processing (TAP) genes and susceptibility to tuberculoid leprosy and pulmonary tuberculosis. Tissue Antigens 49(2):168-72, 1997.
11. Moraes MO, Pacheco AG, Schonkeren JJ, Vanderborght PR, Nery JA, Santos AR, et al. Interleukin-10 promoter single-nucleotide polymorphisms as markers for disease susceptibility and disease severity in leprosy. Genes Immun 5(7):592-5, 2004.
12. Vanderborght PR, Pacheco AG, Moraes ME, Antoni G, Romero M, Verville A, et al. HLA-DRB1*04 and DRB1*10 are associated with resistance and susceptibility, respectively, in Brazilian and Vietnamese leprosy patients. Genes Immun 8(4):320-4, 2007.
13. Siddiqui MR, Meisner S, Tosh K, Balakrishnan K, Ghei S, Fisher SE, et al. A major susceptibility locus for leprosy in India maps to chromosome 10p13. Nat Genet 27(4):439-41, 2001.
14. Alter A, De Leseleuc L, Van Thuc N, Thai VH, Huong NT, Ba NN, et al. Genetic and functional analysis of common MRC1 exon 7 polymorphisms in leprosy susceptibility. Hum Genet 127(3):337-48.
15. Mira MT, Alcais A, Van Thuc N, Thai VH, Huong NT, Ba NN, et al. Chromosome 6q25 is linked to susceptibility to leprosy in a Vietnamese population. Nat Genet 33(3):412-5, 2003.
16. Mira MT, Alcais A, Nguyen VT, Moraes MO, Di Flumeri C, Vu HT, et al. Susceptibility to leprosy is associated with PARK2 and PACRG. Nature 427(6975):636-40, 2004.
17. Alcais A, Alter A, Antoni G, Orlova M, Nguyen VT, Singh M, et al. Stepwise replication identifies a low-producing lymphotoxin-alpha allele as a major risk factor for early-onset leprosy. Nat Genet Apr;39(4):517-22, 2007.
18. Wong SH, Hill AV, Vannberg FO. Genomewide association study of leprosy. N Engl J Med 362(15):1446-7; author reply 7-8.
19. Schurr E, Gros P. A common genetic fingerprint in leprosy and Crohn's disease? N Engl J Med 361(27):2666-8, 2009.
20. Britton WJ, Lockwood DN. Leprosy. Lancet 10;363(9416):1209-19, 2004.
21. Smith WC, Nicholls PG, Das L, Barkataki P, Suneetha S, Suneetha L, et al. Predicting neuropathy and reactions in leprosy at diagnosis and before incident events-results from the INFIR cohort study. PLoS Negl Trop Dis 3(8):e500, 2009.
22. Ranque B, Nguyen VT, Vu HT, Nguyen TH, Nguyen NB, Pham XK, et al. Age is an important risk factor for onset and sequelae of reversal reactions in Vietnamese patients with leprosy. Clinical Infectious Diseases 44(1):33-40, 2007.
23. Kahawita IP, Walker SL, Lockwood DNJ. Leprosy type 1 reactions and erythema nodosum leprosum. Anais Brasileiro de Dermatologia 83(1):75-82, 2008.
24. Moraes MO, Sampaio EP, Nery JA, Saraiva BC, Alvarenga FB, Sarno EN. Sequential erythema nodosum leprosum and reversal reaction with similar lesional cytokine mRNA patterns in a borderline leprosy patient. Br J Dermatol 144(1):175-81, 2001.
25. Scollard DM, Adams LB, Gillis TP, Krahenbuhl JL, Truman RW, Williams DL. The continuing challenges of leprosy. Clin Microbiol Rev 19(2):338-81, 2006.
26. Ridley DS, Jopling WH. Classification of leprosy according to immunity. A five-group system. International Journal of Leprosy and others Mycobacteium Diseases 34(3):255-73, 1966.
27. Pocaterra L, Jain S, Reddy R, Muzaffarullah S, Torres O, Suneetha S, et al. Clinical course of erythema nodosum leprosum: an 11-year cohort study in Hyderabad, India. Am J Trop Med Hyg 74(5):868-79, 2006.
28. Vasselon T, Detmers PA. Toll receptors: a central element in innate immune responses. Infect Immun 70(3):1033-41, 2002.
29. Bochud PY, Hawn TR, Siddiqui MR, Saunderson P, Britton S, Abraham I, et al. Toll like receptor 2 (TLR2) polymorphisms are associated with reversal reaction in leprosy. The Journal of Infectious Diseases 197(2):253-61, 2008.
30. Misch EA, Macdonald M, Ranjit C, Sapkota BR, Wells RD, Siddiqui MR, et al. Human TLR1 deficiency is associated with impaired mycobacterial signaling and protection from leprosy reversal reaction. PLoS Negl Trop Dis 2(5):e231, 2008.
31. Schuring RP, Hamann L, Faber WR, Pahan D, Richardus JH, Schumann RR, et al. Polymorphism N248S in the human Toll-like receptor 1 gene is related to leprosy and leprosy reactions. J Infect Dis 199(12):1816-9, 2009.
32. Berrington WR, Macdonald M, Khadge S, Sapkota BR, Janer M, Hagge DA, et al. Common polymorphisms in the NOD2 gene region are associated with leprosy and its reactive states. J Infect Dis 201(9):1422-35, 2010.
33. Fine PE. Leprosy: what is being "eliminated"? Bull World Health Organ 85(1):2, 2007.
34. Moraes MO, Sarno EN, Almeida AS, Saraiva BC, Nery JA, Martins RC, et al. Cytokine mRNA expression in leprosy: a possible role for interferon-gamma and interleukin-12 in reactions (RR and ENL). Scand J Immunol 50(5):541-9, 1999.
35. Stefani MM, Guerra JG, Sousa AL, Costa MB, Oliveira ML, Martelli CT, et al. Potential plasma markers of type 1 and type 2 leprosy reactions: a preliminary report. BMC Infect Dis 9:75, 2009.
36. Malhotra D, Darvishi K, Sood S, Sharma S, Grover C, Relhan V, et al. IL-10 promoter single nucleotide polymorphisms are significantly associated with resistance to leprosy. Hum Genet 118(2):295-300, 2005.
37. Pereira AC, Brito de Souza VN, Cardoso CC, Dias Baptista IM, Parelli FP, Venturini J, et al. Genetic, epidemiological and biological analysis of interleukin-10 promoter single-nucleotide polymorphisms suggests a definitive role for -819C/T in leprosy susceptibility. Genes Immun 10(2):174-80, 2009.
38. Shaw MA, Donaldson IJ, Collins A, Peacock CS, Lins-Lainson Z, Shaw JJ, et al. Association and linkage of leprosy phenotypes with HLA class II and tumour necrosis factor genes. Genes Immun 2(4):196-204, 2001.
39. Santos AR, Suffys PN, Vanderborght PR, Moraes MO, Vieira LM, Cabello PH, et al. Role of tumor necrosis factor-alpha and interleukin-10 promoter gene polymorphisms in leprosy. J Infect Dis 186(11):1687-91, 2002.
40. Franceschi DS, Mazini PS, Rudnick CC, Sell AM, Tsuneto LT, Ribas ML, et al. Influence of TNF and IL10 gene polymorphisms in the immunopathogenesis of leprosy in the south of Brazil. Int J Infect Dis 13(4):493-8, 2009.
41. Moraes MO, Duppre NC, Suffys PN, Santos AR, Almeida AS, Nery JA, et al. Tumor necrosis factor-alpha promoter polymorphism TNF2 is associated with a stronger delayed-type hypersensitivity reaction in the skin of borderline tuberculoid leprosy patients. Immunogenetics 53(1):45-7, 2001.
42. Vejbaesya S, Mahaisavariya P, Luangtrakool P, Sermduangprateep C. TNF alpha and NRAMP1 polymorphisms in leprosy. J Med Assoc Thai 90(6):1188-92, 2007.
43. Moura DF, Teles RM, Ribeiro-Carvalho MM, Teles RB, Santos IM, Ferreira H, et al. Long-term culture of multibacillary leprosy macrophages isolated from skin lesions: a new model to study Mycobacterium leprae-human cell interaction. Br J Dermatol 157(2):273-83, 2007.
44. Hagge DA, Saunders BM, Ebenezer GJ, Ray NA, Marks VT, Britton WJ, et al. Lymphotoxin-alpha and TNF have essential but independent roles in the evolution of the granulomatous response in experimental leprosy. Am J Pathol 174(4):1379-89, 2009.
45. Kratz A, Campos-Neto A, Hanson MS, Ruddle NH. Chronic inflammation caused by lymphotoxin is lymphoid neogenesis. J Exp Med 183(4):1461-72, 1996.
46. Roach DR, Briscoe H, Saunders B, France MP, Riminton S, Britton WJ. Secreted lymphotoxin-alpha is essential for the control of an intracellular bacterial infection. J Exp Med 193(2):239-46, 2001.
47. Le Cabec V, Emorine LJ, Toesca I, Cougoule C, Maridonneau-Parini I. The human macrophage mannose receptor is not a professional phagocytic receptor. J Leukoc Biol 77(6):934-43, 2005.
48. Largent BL, Walton KM, Hoppe CA, Lee YC, Schnaar RL. Carbohydrate-specific adhesion of alveolar macrophages to mannose-derivatized surfaces. J Biol Chem 259(3):1764-9, 1984.
49. Zhang Y, Gao J, Chung KK, Huang H, Dawson VL, Dawson TM. Parkin functions as an E2-dependent ubiquitin- protein ligase and promotes the degradation of the synaptic vesicle-associated protein, CDCrel-1. Proc Natl Acad Sci USA 97(24):13354-9, 2000.
50. Shimura H, Hattori N, Kubo S, Mizuno Y, Asakawa S, Minoshima S, et al. Familial Parkinson disease gene product, parkin, is a ubiquitin-protein ligase. Nat Genet 25(3):302-5, 2000.
51. Marin I, Ferrus A. Comparative genomics of the RBR family, including the Parkinson's disease-related gene parkin and the genes of the ariadne subfamily. Mol Biol Evol 19(12):2039-50, 2002.
52. Kitada T, Asakawa S, Hattori N, Matsumine H, Yamamura Y, Minoshima S, et al. Mutations in the parkin gene cause autosomal recessive juvenile parkinsonism. Nature 392(6676):605-8, 1998.
53. Moore DJ. Parkin: a multifaceted ubiquitin ligase. Biochem Soc Trans 34(Pt 5):749-53, 2006.
54. Robinson PA, Ardley HC. Ubiquitin-protein ligases. J Cell Sci 117(Pt 22):5191-4, 2004.
55. Palacino JJ, Sagi D, Goldberg MS, Krauss S, Motz C, Wacker M, et al. Mitochondrial dysfunction and oxidative damage in parkin-deficient mice. J Biol Chem 279(18):18614-22, 2004.
56. Yang H, Zhou HY, Li B, Niu GZ, Chen SD. Downregulation of parkin damages antioxidant defenses and enhances proteasome inhibition-induced toxicity in PC12 cells. J Neuroimmune Pharmacol 2(3):276-83, 2007.
57. Fulco TO, Lopes UG, Sarno EN, Sampaio EP, Saliba AM. The proteasome function is required for Mycobacterium leprae-induced apoptosis and cytokine secretion. Immunol Lett 110(1):82-5, 2007.
58. Ali S, Vollaard AM, Widjaja S, Surjadi C, Van de Vosse E, Van Dissel JT. PARK2/PACRG polymorphisms and susceptibility to typhoid and paratyphoid fever. Clin Exp Immunol 144(3):425-31, 2006.

© Está  expresamente prohibida la redistribución y la redifusión de todo o parte de los  contenidos de la Sociedad Iberoamericana de Información Científica (SIIC) S.A. sin  previo y expreso consentimiento de SIIC
anterior.gif (1015 bytes)

Bienvenidos a siicsalud
Acerca de SIIC Estructura de SIIC


Sociedad Iberoamericana de Información Científica (SIIC)
Mensajes a SIIC

Copyright siicsalud© 1997-2024, Sociedad Iberoamericana de Información Científica(SIIC)