siiclogo2c.gif (4671 bytes)
LESÃO ERITROCITÁRIA E ACTIVAÇÃO LEUCOCITÁRIA COMO POTENCIAIS MARCADORES DE RISCO DE EVENTOS CARDIOVASCULARES
(especial para SIIC © Derechos reservados)
santosal.jpg
Autor:
Alice Santos-Silva
Columnista Experto de SIIC

Institución:
Instituto de Biologia Molecular e Celular Faculdade de Farmácia Universidade do Porto Porto, Portugal

Artículos publicados por Alice Santos-Silva 
Coautores Irene Rebelo.*  Luís Belo**  Isabel Monteiro***  Natércia Teixeira****  Elisabeth Castro Professora*****  AlexandreQuintanilha****** 
Professora Auxiliar com Agregação. Faculdade de Farmácia e Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto*
Assistente Doutorado. Faculdade de Farmácia e Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto**
PhD Centro de Saúde de Aldoar, Sub-Região de Saúde do Porto***
Professora Associada com Agregação Faculdade de Farmácia e Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto****
Auxiliar com Agregação Faculdade de Farmácia e Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto*****
Professor Catedrático Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar e Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto******


Recepción del artículo: 13 de abril, 2004
Aprobación: 0 de , 0000
Conclusión breve
Os nossos resultados sugerem que a concentração plasmática de elastase e lactoferrina, em conjunto com os valores de hemoglobina ligada à membrana e o perfil da banda 3, devem ser estudados como potenciais marcadores de risco de eventos cardiovasculares

Resumen

Os factores lipídicos tradicionais de risco permitem prever apenas alguns dos eventos cardiovasculares. Tem sido nosso objectivo o estudo e a procura de novos marcadores biológicos de risco, nomeadamente a lesão eritrocitária e a activação leucocitária. Estudámos estes potenciais marcadores de risco em doentes em risco de eventos cardiovasculares, em casos de enfarte de miocárdio e de acidente cérebro vascular isquémico e em adolescentes praticantes de exercício físico moderado e de alta competição. Foram também realizados estudos in vitro a fim de clarificar o valor dos marcadores propostos. Observámos nos doentes um aumento de leucócitos, que parecem activados, como evidenciado pelo aumento dos seus produtos de activação, elastase e lactoferrina. Esta activação parece impôr lesões e um envelhecimento prematuro dos eritrócitos, como sugere o aumento de hemoglobina ligada à membrana e um distinto perfil de banda 3 observado. Nos estudos in vitro verificou-se que as modificações impostas no perfil da banda 3 por neutrófilos activados e por elastase em concentrações crescentes se correlacionavam e eram semelhantes às apresentadas pelos eritrócitos mais velhos. Os nossos resultados sugerem que a concentração plasmática de elastase e lactoferrina, em conjunto com os valores de hemoglobina ligada à membrana e o perfil da banda 3, devem ser estudados como potenciais marcadores de risco de eventos cardiovasculares.

Palabras clave
Eritrócito, neutrófilo, banda 3, activação leucocitária, factores de risco

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/67964

Especialidades
Principal: Cardiología
Relacionadas: BioquímicaDiagnóstico por LaboratorioHematología

Enviar correspondencia a:
Alice Santos Silva. Rua Aníbal Cunha, 164; Faculdade de Farmácia, 4050-047 Porto, Portugal Santos-Silva, Alice


ERYTHROCYTE DAMAGE AND LEUKOCYTE ACTIVATION AS POTENTIAL RISK MARKERS FOR CARDIOVASCULAR EVENTS

Abstract
The traditional lipid risk factors can only predict some of the cardiovascular events. Our recent work has focused on new potential biological markers of risk, namely erythrocyte damage and leukocyte activation. We have studied these potential markers in patients at risk for cardiovascular events, in myocardial infarction and ischemic stroke cases and in adolescents practising moderate and high competition physical exercise. Some in vitro studies were also performed to strengthen the value of the proposed markers. We found a rise in leukocytes which seem to be activated, as shown by the increase in their activation products, elastase and lactoferrin. This activation seems to impose erythrocyte damage and premature aging, as suggested by the increase in membrane bound hemoglobin and by a different band 3 profile. The in vitro studies showed that the modifications imposed to band 3 profile by increasing concentrations of activated neutrophils and elastase were correlated, and were similar to those presented by older erythrocytes. Our data suggest that plasma levels of elastase and lactoferrin, together with levels of erythrocyte membrane bound hemoglobin and band 3 profile, warrants further studies as potential new markers of risk for cardiovascular events.


LESÃO ERITROCITÁRIA E ACTIVAÇÃO LEUCOCITÁRIA COMO POTENCIAIS MARCADORES DE RISCO DE EVENTOS CARDIOVASCULARES

(especial para SIIC © Derechos reservados)
Artículo completo
Aterogénese
Vários estudos epidemiológicos e laboratoriais têm evidenciado diferentes factores de risco de eventos cardiovasculares, nomeadamente um perfil lipídico alterado (hipertrigliceridemia, hipercolesterolemia, concentrações elevadas de colesterol das lipoproteínas de baixa densidade, de apolipoproteína B e de lipoproteína (a); baixas concentrações de colesterol das lipoproteínas de alta densidade e da apolipoproteína A), hábitos tabágicos, sedentarismo, hipertensão arterial, hiperfibrinogenemia, hiper-homocisteinemia, obesidade. Estes factores de risco podem ocorrer isoladamente ou em associação sinérgica, todavia, permitem prever apenas alguns dos eventos cardiovasculares. Considerando a importância das DCV, pela sua prevalência e complicações associadas (a primeira causa de mortalidade e de morbilidade em Portugal)1 e que os factores de risco tradicionais prevêm apenas alguns dos eventos, torna-se importante o estudo de novos marcadores de risco.2,3A importância dos lípidos e das lipoproteínas na aterogénese é inquestionável. Estão também envolvidas diversas células e processos metabólicos no processo aterogénico, o qual pode ter início ou não numa lesão do endotélio vascular. O processo aterogénico pode iniciar-se pela adesão de monócitos/macrófagos à célula endotelial morfologicamente ilesa, na sequência da infiltração de LDL no espaço subendotelial. Neste espaço, a LDL é modificada oxidativamente, sendo esta modificação determinada por metabolitos de oxigénio que podem ter origem nos monócitos/macrófagos, nas células musculares lisas ou nas células do endotélio vascular. A LDL oxidada constitui um factor quimiotáctico para os monócitos circulantes, tem capacidade para inibir a motilidade dos macrófagos, sendo fagocitada por estes mais avidamente do que a LDL nativa. Ou seja, da modificação oxidativa das LDL no espaço subendotelial resulta a mobilização de monócitos da circulação sanguínea, a acumulação de macrófagos e a formação de células "foam". Este processo adquire uma progressão "auto-catalítica" em que interactuam células activadas do espaço extra-vascular (macrófagos, linfócitos, células musculares lisas), da parede vascular e do espaço intra-vascular (plaquetas, monócitos, neutrófilos, linfócitos). No centro desta interacção celular está o macrófago que, para além de constituir uma fonte importante de metabolitos de oxigénio e proteases, é capaz de secretar citoquinas que induzem activação e proliferação de células musculares lisas, fibroblastos e células endoteliais, também elas capazes de produzir e secretar mediadores inflamatórios como o interferon, o TNF, a PAF.4 Algumas das citoquinas secretadas pelas células inflamatórias têm capacidade para activar células da circulação sanguínea, nomeadamente o monócito, o linfócito, o neutrófilo e as plaquetas.
É razoável que a activação celular decorrente do processo aterosclerótico, acompanhada por libertação de mediadores de activação leucocitária, de proteases e de metabolitos de oxigénio capazes de difusão através das membranas celulares, contribua para o desenvolvimento de um ambiente de stress oxidativo e proteolítico.
A localização típica das placas ateroscleróticas na rede vascular,5 em zonas de turbulência e estase, é sugestiva da importância de uma interacção próxima das células no processo aterosclerótico, por favorecer a interacção celular e dos seus produtos de activação e, ainda, por favorecer a lesão do endotélio vascular. A viscosidade sanguínea é também um factor importante, favorecendo a turbulência, estase e interacção celular.6 Esta, é determinada por condições físicas como a temperatura, por forças de atrito entre as células capazes de romper a agregação eritrocitária e induzir a deformação celular, e, ainda, pela composição sanguínea (hematócrito, capacidade de deformabilidade dos eritrócitos, número de leucócitos, concentração de lípidos plasmáticos, de fibrinogénio) e pela tensão arterial.6,7
Importância dos neutrófilos
Os doentes cardiovasculares apresentam frequentemente uma leucocitose do tipo neutrofílico, sugestiva do envolvimento do neutrófilo na fisiopatologia da aterogénese.8,9 Foi atribuída capacidade para activar o neutrófilo a algumas citoquinas secretadas pelo macrófago e por outras células inflamatórias, como a IL-1, IL-8 e TNF.
O neutrófilo é uma célula de recursos sofisticados e complexos, em comunicação contínua com o meio circundante. Possui no seu citoplasma quatro tipos de granulações,10 as granulações primárias ou azurófilas, as secundárias ou neutrófilas, as granulações terciárias e as vesículas secretórias, sendo estas duas últimas apenas visíveis à microscopia electrónica.
As granulações neutrófilas, específicas do neutrófilo, são ricas em fosfatase alcalina, lisozima, aminopeptidase e lactoferrina. As granulações azurófilas, também presentes no monócito, são ricas em mieloperoxidase, fosfatase ácida, β-lactosidase, β-glucuronidase, proteínas catiónicas, colagenase e elastase.
Em condições fisiológicas, os neutrófilos estabelecem ligações fracas com o endotélio vascular através de moléculas de adesão (selectinas), rolando ao longo da rede vascular. A adesão firme do neutrófilo ao endotélio vascular é mediada por outro tipo de moléculas de adesão, as integrinas, que permitem a transmigração do neutrófilo para o espaço extra-vascular, seguindo gradientes de factores quimiotácticos como os metabolitos de oxigénio, factores do complemento, substâncias hidrossolúveis de origem bacteriana, metabolitos do ácido araquidónico, produtos de activação plaquetária, citoquinas e interleuquinas produzidas pelas diversas células mediadoras da inflamação. A activação do neutrófilo é acompanhada de desgranulação e de activação metabólica, com produção de metabolitos de oxigénio, como o anião superóxido, peróxido de hidrogénio, radical hidroxilo e oxigénio singleto.
A produção de metabolitos de oxigénio e a libertação de proteases pelas células inflamatórias no espaço vascular ou próximo deste, como acontece nas placas ateroscleróticas, pode determinar modificações oxidativas e/ou proteolíticas nas células endoteliais ou do espaço subendotelial, nas células sanguíneas, nomeadamente nos eritrócitos e em diferentes constituintes plasmáticos, favorecendo a aterogénese e o risco de eventos cardiovasculares.
Importância dos eritrócitos
O eritrócito é uma célula particularmente sensível a agressões oxidativas e proteolíticas por ter uma capacidade sintética muito limitada, que o impede de substituir ou reparar as modificações ocorridas nas suas proteínas. Ao longo da sua vida o eritrócito sofre e acumula lesões físicas e químicas decorrentes de um processo de senescência normal ou de agressões físicas e químicas.11-14
Considerando que a síntese de novo é limitada no eritrócito e que a remoção de eritrócitos senescentes ou lesados é mediada pelos macrófagos, o sinal tradutor de lesão ou envelhecimento deve resultar da modificação de um dos constituintes normais do eritrócito maduro e localizar-se na superfície exofacial da membrana, permitindo aos macrófagos identificar modificações bioquímicas intra-eritrocitárias traduzidas para a membrana. Vários estudos evidenciaram a presença de um neoantigénio de senescência na superfície da membrana de eritrócitos senescentes ou lesados, que se liga a auto-anticorpos específicos do tipo IgG. Estes, são anticorpos naturais específicos para a proteína banda 3 da membrana do eritrócito e em conjunto com o complemento medeiam o reconhecimento e remoção de eritrócitos senescentes ou lesados pelos macrófagos.15-19
A proteína banda 3 de 90-100 Kd, é uma proteína transmembranar com diferentes funções na célula.20 O domínio citoplasmático é portador dos locais de fixação de proteínas do citosqueleto (4.2, 4.1 e anquirina) e de ligação de alta afinidade para várias enzimas da glicólise (G3PD, PK, aldolase) e para a hemoglobina oxidada. O domínio transmembranar e extracelular é responsável pelo transporte de aniões. Esta proteína distribui-se uniformemente pela membrana e liga-se aos auto-anticorpos naturais anti-banda 3 através de ligações não covalentes. Em caso de proteólise, de agregação ou de exposição anormal dos epítopos de banda 3, esta ligação aos anticorpos anti-banda 3 torna-se forte, indissociável, promovendo a activação do complemento e, finalmente, a remoção do GV velho ou lesado pelos macrófagos.
Sendo oxidada, a hemoglobina poderá ser regenerada ao seu estado reduzido funcional, pelos sistemas NADPH/meta-hemoglobina redútase principal e NADH/meta-hemoglobina redútase acessória. No caso de falência destes sistemas, a hemoglobina oxidada liga-se preferencialmente ao domínio citoplasmático da proteína banda 3, promovendo a sua agregação.21
A desnaturação da hemoglobina e, por consequência, a agregação da banda 3, pode resultar do desenvolvimento de stress oxidativo na célula, por falência dos mecanismos de defesa antioxidante, decorrente de um processo de envelhecimento eritrocitário normal ou imposto por uma situação de stress oxidativo.13,22
A activação leucocitária, com produção de metabolitos de oxigénio e proteases, pode determinar modificações nas proteínas da membrana do GV alterando a sua antigenicidade, determinar a oxidação de lípidos da membrana e a oxidação da hemoglobina e, finalmente, a remoção prematura dos eritrócitos lesados.23-28
Potenciais marcadores de risco
Os estados inflamatórios de origem fisiológica ou patológica têm em comum o facto de poderem evoluir de uma forma súbita e muitas vezes imprevisível para um evento grave ou mesmo fatal.
Estes processos inflamatórios de origem fisiológica, como o exercício físico e a gravidez, ou de origem patológica, como as doenças cardiovasculares, cursam habitualmente com uma leucocitose do tipo neutrofílico e frequentemente com uma redução no número de eritrócitos. Esta associação sugere que a exposição de eritrócitos a metabolitos de oxigénio e a proteases, ambos produzidos por neutrófilos activados, pode determinar lesões oxidativas e/ou proteolíticas nos eritrócitos, cuja acumulação, pode ser determinante de uma remoção acelerada e prematura de eritrócitos. Ou seja, é provável que o GV sob stress oxidativo ou proteolítico seja marcado precocemente para a morte, por modificações na proteína banda 3.
Na procura de novos marcadores de risco temos avaliado em diferentes processos inflamatórios fisiológicos e patológicos, o eritrócito como um marcador cumulativo de stress oxidativo e proteolítico e os neutrófilos como uma fonte de metabolitos de oxigénio e de proteases.
Num primeiro estudo feito em doentes em risco de eventos cardiovasculares (hipertensos; sobreviventes de enfarte de miocárdio com mais de 3 meses; sobreviventes de enfarte de miocárdio com menos de 48 horas) e num grupo controlo,29 verificámos que o valor de hemoglobina ligada à membrana (HbLM) era superior nos doentes e que o perfil da proteína banda 3 da membrana eritrocitária (% de monómero, agregados e fragmentos) era diferente, apresentando os doentes valores mais elevados de agregados de banda 3 e mais baixos de monómero e de fragmentos proteolíticos; os valores de agregação da banda 3 eram acompanhados de uma maior ligação de IgG à membrana. Observou-se ainda uma correlação negativa da concentração de neutrófilos, quer com a concentração de GV quer com a actividade da glucose-6-fosfato desidrogenase eritrocitária (um reconhecido índice de idade eritrocitária).
A fim de clarificar a aparente relação entre lesão e envelhecimento eritrocitário com a acção de produtos de activação do neutrófilo, observada no estudo anterior, procedemos a um estudo in vitro,30 no qual avaliámos o valor de HbLM e o perfil da banda 3 em GV de idades diferentes (separados por centrifugação em gradiente de densidade), em GV incubados com neutrófilos activados, em concentrações crescentes, e em GV incubados com elastase do neutrófilo, também em concentrações crescentes. A relação usada, entre o número de neutrófilos e o número de GV, era igual ou superior à observada nos doentes que haviam sofrido um enfarte de miocárdio recente. Reforçando a hipótese do envolvimento de neutrófilos activados na lesão e envelhecimento eritrocitário, verificámos que as modificações impostas por concentrações crescentes de neutrófilos activados e de elastase sobre o perfil da banda 3 se correlacionavam positivamente. Verificou-se ainda que estas modificações eram semelhantes às observadas em GV mais densos e mais velhos.
É aceite que o exercício físico moderado constitui um protector cardiovascular,31,32 embora o mecanismo subjacente não esteja bem definido.33 Quanto ao exercício físico intenso, como o de alta competição, alguma controvérsia ainda existe quanto ao seu efeito protector.34
O exercício físico é acompanhado de um aumento no metabolismo celular, no ritmo cardíaco e respiratório e na temperatura fisiológica. Observa-se ainda uma perda de líquidos e uma leucocitose neutrofílica. A perda de líquidos determina uma redução no volume plasmático com hemoconcentração e hiperviscosidade plasmática. Estas modificações, em conjunto com o número elevado de leucócitos, de capacidade de deformabilidade reduzida, podem contribuir para alterações hemorreológicas importantes. Durante o exercício físico, os GV devem transportar oxigénio aos tecidos sob um fluxo mais elevado e num meio mais viscoso. O aumento do metabolismo celular e do "turnover" da hemoglobina (oxigenação/desoxigenação) favorecem a produção de metabolitos de oxigénio no plasma e nos eritrócitos, a activação leucocitária e o desenvolvimento de stress oxidativo.35-36
Considerando as modificações associadas ao exercício físico, é razoável questionar o benefício do exercício físico de alta competição, já que é provável o desenvolvimento de um stress oxidativo e proteolítico elevado e contínuo. Com o objectivo de estudar este efeito, avaliámos e comparámos o perfil lipídico e os valores de activação leucocitária, de lesão eritrocitária e de stress oxidativo em dois grupos de adolescentes de perfil lipídico normal.37 Um dos grupos incluiu nadadores de alta competição e o outro adolescentes que praticavam exercício físico nas aulas de educação física das respectivas escolas. Verificámos que os adolescentes nadadores de alta competição apresentavam valores mais elevados de produtos de activação leucocitária (elastase e lactoferrina), valores mais elevados de HbLM e um perfil de banda 3 perfeitamente distinto do grupo controlo, com aumento dos agregados e redução dos fragmentos proteolíticos, à semelhança do que havíamos observado nos estudos anteriores sugestivos do envolvimento da activação leucocitária na lesão e envelhecimento de eritrócitos.
No perfil lipídico observámos modificações protectoras e modificações de risco. Observámos valores mais elevados de colesterol total, de colesterol das lipoproteínas de baixa densidade (LDLc) e de lipoproteína (a) (Lp(a), valores mais baixos de apolipoproteína AI (Apo AI), como modificações de risco. Como modificações protectoras, observámos valores mais baixos de apolipoproteína B (Apo B) e de triglicerídeos (TG), valores mais elevados de colesterol das liproteínas de alta densidade (HDLc). A associação de valores mais elevados de LDLc e de stress oxidativo observada nos nadadores, pode constituir um risco aterogénico acrescido, se considerarmos a regularidade e a intensidade do exercício físico praticada por estes adolescentes.
A adaptação ao exercício físico intenso parece associar-se a níveis elevados de produtos de activação leucocitária e a envelhecimento e remoção acelerada e prematura. É provável que o exercício físico de alta competição impondo níveis mais elevados de metabolitos de oxigénio e proteases, de colesterol e de LDL, possa favorecer a lesão de células endoteliais e o desenvolvimento prematuro de lesões ateroscleróticas. Além disso, no decorrer da prática de exercício físico intenso todas as modificações se acentuam devido à hemoconcentração por perda de líquidos, o que favorecerá a lesão endotelial e a infiltração lipídica, sobretudo em zonas de maior turbulência e estase na rede vascular.
Num trabalho mais recente,38 o estudo destes potenciais marcadores de risco foi avaliado em doentes diagnosticados com acidente cerebrovascular isquémico por imagem tomográfica computorizada. Para além da concentração plasmática de elastase e de lactoferrina, como marcadores de activação leucocitária, do perfil da banda 3 e do valor de HbLM, como marcadores de lesão eritrociária, avaliou-se o perfil lipídico (colesterol, LDLc, HDLc, TG, Apo AI, Apo B, Lp(a)) e o hemograma (nº GV, concentração de hemoglobina, hematócrito, índices hematimétricos, nº leucócitos e respectiva contagem diferencial).
Verificou-se que os doentes apresentavam valores significativamente mais elevados de leucócitos, em particular de granulócitos, cujo valor quase duplicou relativamente ao grupo controlo. A concentração de elastase e de lactoferrina aumentou também de forma significativa nos doentes, para valores superiores ao dobro do valor apresentado pelo controlo.
O estudo eritrocitário revelou um franco aumento no valor de HbLM (quatro vezes superior ao valor do controlo) e um perfil de banda 3 distinto nos doentes. Estes apresentavam um aumento significativo de agregados de banda 3 e uma redução dos seus fragmentos proteolíticos.
Os resultados observados nestes doentes de acidente cerebrovascular isquémico, sugerem que esta patologia está associada a um aumento no número de neutrófilos e dos seus produtos de activação, os quais parecem estar relacionados com as lesões eritrocitárias observadas, nomeadamente com um aumento de HbLM e de agregação da banda 3.
Considerações finais
A aterogénese com um desenvolvimento progressivo, inicia-se na primeira ou na segunda década de vida, manifestando-se clinicamente algumas décadas mais tarde.
Os estudos epidemiológicos têm evidenciado que para além dos factores de risco tradicionais (lípidos e lipoproteínas), existem outros factores que também traduzem risco cardiovascular. É o caso da viscosidade sanguínea,6,7 cujo valor é definido por condições físicas (temperatura, fluxo sanguíneo e forças de atrito) e pela composição sanguínea (concentração e capacidade de deformabilidade e de agregabilidade dos GV, número de leucócitos, concentração de lípidos).
A localização típica das lesões ateroscleróticas em zonas de turbulência e também de maior estase sanguínea, é sugestiva da importância de uma interacção próxima das células e dos seus produtos de activação no processo aterogénico.39 A progressão da lesão aterosclerótica, com estreitamento do lúmen vascular acentuará a turbulência e estase nestas zonas, bem como a interacção de células e dos seus produtos de activação.
Sendo os neutrófilos células de reduzida capacidade de deformabilidade, um aumento do número de neutrófilos circulantes contribuirá para aumentar a turbulência e estase sanguínea a nível das lesões ateroscleróticas, sobretudo em caso de redução do lúmen vascular. A presença de eritrócitos senescentes ou lesados, com uma maior rigidez de membrana e menor capacidade de deformabilidade, terão um impacto hemorreológico semelhante. Acresce que ao processo de senescência eritrocitária é também atribuído uma redução do ácido siálico e a exposição de fosfolípidos acídicos no folheto lipídico exterior da membrana do GV,40 que determinam uma maior adesividade da célula ao endotélio vascular e maior agregabilidade dos eritrócitos.
Em conclusão, o neutrófilo e seus produtos de activação, com um papel activo e reconhecido no processo aterogénico, parece constituir um agente de lesão eritrocitária, determinando modificações cumulativas a nível da membrana do GV, que marcam prematuramente a célula para a morte, e que se traduzem numa redução da capacidade de deformabilidade da célula. As modificações hemodinâmicas decorrentes de um aumento de leucócitos e de GV menos deformáveis, de maior adesividade e mais agregáveis, devem favorecer o processo aterogénico por facilitar a interacção dos diversos intervenientes neste processo.
Propõe-se o estudo do eritrócito como um potencial marcador cumulativo de risco, nomeadamente a avaliação do valor de hemoglobina ligada à membrana e o perfil da proteína banda 3. Propomos ainda como potenciais marcadores de risco o valor de neutrófilos circulantes e dos seus produtos de activação – elastase e lactoferrina.
Los autores no manifiestan conflictos.
Bibliografía del artículo
  1. Sá P, Dias JÁ, Pereira Miguel JM. Ischaemic heart disease (IHD) and cerebrovascular disease (CVD) mortality evolution in Portugal, 1980-1989. Acta Méd Port, 1994, 7 : 71-81.
  2. Marmot M. In Atherosclerosis XII, Ed Stemme S Olsson AG, Elsevier Science. Epidemiology and mechanisms of atherosclerosis: bringing the perspectives together. 2000, 125-37.
  3. Hansson GK. In Atherosclerosis XII, Ed Stemme S Olsson AG, Elsevier Science. Inflammation, injury and atherosclerosis – the Russel Ross memorial lecture. 2000, 53-66.
  4. Lucas AD, Greaves DR. Atherosclerosis: role of chemokines and macrophages. Exp Rev Mol Med, 2001, 5 : 1-18.
  5. Davies PF, Barbee KA, Lal R, Robotewskyj A, Griem ML. Hemodynamics and atherogenesis. Endothelial surface dynamics in flow signal transduction. In Atherosclerosis III Recent Research Advances in Atherosclerosis. Numano F, Wissler RW Eds. Ann NY Acad Sci, 1995; 748:86-103.
  6. Lowe GDO. Blood viscosity cardiovascular risk. Curr Opin Lipidol, 1993; 4 : 283-287.
  7. Cicco G, Pirelli A. Red blood cell (RBC) deformability, RBC aggregability and tissue oxygenation in hypertension. Clin Hemorheol Circ 1999, 21 : 169-177.
  8. Schleimer RP, Rutledge BK. Cultured human vascular endothelial cells acquire adhesiveness for neutrophils after stimulation with interleukin 1, endotoxin and tumor-promoting phobol esters. J Immunol 1986, 136 : 649.
  9. Hoffman M, Blum A, Baruch R, Kaplan E, Benjamin M. Leukocytes and coronary artery disease. Atherosclerosis, 2004; 172 : 1-6.
  10. Borregaard N, Lollike K, Kjeldsen L, Sengelov H, Bastholm L, Nielsen MH, Bainton DF. Human neutrophil granules and secretory vesicles. Eur J Haematol, 1993, 51 : 187-198.
  11. Lutz HU. Erythrocyte clearance blood cell biochemistry. In: Harris JR, editor, Erythroid cells. New York : Plenum, 1990, 81-120.
  12. Brovelli A, Castellana MA, Minetti G, Piccinini G, Seppi C, Renzis MR, Balduini C. Conformational changes and oxidation of membrane proteins in senescent human erythrocytes. In: Magnani M, De Flora A, editors. Red blood cell aging. New York: plenum, 1991, 59-73.
  13. Kay MMB, Marchalonis JJ, Schluter SF, Bosman G. Human erythrocyte aging: cellular and molecular biology. Transf Med Rev, 1991, 3:173-95.
  14. Bosch FH, Were JM, Scipper L, Roerdinkholder-Stoelwinder B, Huls T, Willekens FLA, Wichers G, Halie MR. Determinants of red blood cell deformability in relation to cell age. Eur J Haematol 1994, 52 : 35-41.
  15. Kay MMB. Role of physiologic autoantibody in the removal of senescent human red cells. J Supramol Struct 1978, 9:555-67.
  16. Kay MMB, Goodman SR, Sorensen K, Whitfield CF, Wong P, Zaki L, Rudloff V. Senescent cell antigen is immunologically related to band 3. Proc Natl Acad Sci USA 1983, 80:1631-5.
  17. Kay MMB. Localization of senescent cell antigen on band 3. Proc Natl Acad Sci USA, 1984, 81:5753-7.
  18. Kay MMB, Flowers N, Goodman SR, Bosman G. Alterations in membrane protein band 3 associated with accelerated erythrocyte aging. Proc Natl Acad Sci USA, 1989, 816:5834-7.
  19. Lutz A. Naturally occurring anti-band 3 antibodies. Transf Med Rev, 1992, 3:201-211.
  20. Bruce LJ, Tanner MJA. Erythroid band 3 variants and disease. Ballière\'s Clin Haematol, 1999, 12(4):637-654.
  21. Low PS. Role of hemoglobin denaturation and band 3 clustering in intiating red cell removal. In: Magnani M, De Flora A, editors. Red blood cell aging. New York: Plenum, 1991, 173-183.
  22. Lutz HU, Bussolino F, Flepp R, Fasler S, Stammler P, Kazatchkine MD, Arese P. Naturally occurring anti-band 3 antibodies and complement activation together mediate phagocytosis of oxidatively stressed human erythrocytes. Proc Natl Acad Sci, 1987, 84 : 7368-7372.
  23. Weiss SJ. Neutrophil-mediated methemoglobin formation in the erythrocyte. J Biol Chem, 1982, 257:2947-53.
  24. Claster S, Chiu D, Quintanilha A, Lubin B. Neutrophils mediate lipid peroxidation in human red cells. Blood, 1984, 64:1079-84.
  25. Vercellotti GM, van Asbeck BS, Jacob HS. Oxygen radical-induced erythrocyte hemolysis by neutrophils. Critical role of iron and lactoferrin. J Clin Ivest, 1985, 76 : 956-962.
  26. Claster S, Quintanilha A, Schott MA, Chiu D, Lubin B. Human neutrophil elastase mediate red cells membrane damage. Blood, 1986, 68:92a-100a.
  27. Uyesaka N, Hasegawa S, Ishioka N, Shio H, Schechter NA. Effects of superoxide anions on red cell deformability and membrane proteins. Biorheol, 1992, 29:217-29.
  28. Weiss DJ, Aird B, Murtaugh MP. Neutrpil-mediated immunoglobulin binding to erythrocytes involves proteolytic and oxidative injury. J Leukocyte Biol, 1992, 29 : 217-229.
  29. Santos-Silva A, Castro EMB, Teixeira NA, Guerra FC, Quintanilha A. Altered erythrocyte band 3 profile as a marker in patients at risk for cardiovascular disease. Atherosclerosis, 1995, 116:199-209.
  30. Santos-Silva A, Castro EMB, Teixeira NA, Guerra FC, Quintanilha A. Erythrocyte membrane band 3 profile imposed by cellular aging,by activated neutrophils and by neutrophilic elastase. Clin Chim Acta, 1998, 275:185-196.
  31. Thompson PD, Buchner D, Pina IL, Balady GJ, Williams MA, Marcus BH, Berra K, Blair SN, Costa F, Franklin B, Fletcher F, Gordon NF, Pate RR, Rodriguez BL, Yancey AK, Wenger NK. Exercise and physical activity in the prevention and treatment of arteriosclerotic disease. Circulation, 2003, 107 : 3109-3116.
  32. Stefanick ML, Mackey S, Sheehan M, Ellsworth N, Haskell WL, Wood PD. Effects of diet and exercise in men and postmenopausal women with low levels of HDL cholesterol and high levels of LDL cholesterol. N Engl J Med, 1998, 339 : 12-20.
  33. Powers SK, Lennon SL, Quindry J, Mehta JL. Exercise and cardioprotection. Curr Opin Cardiol, 2002, 17(5) : 495-502.
  34. Sánchez-Quesada JL, Homs- Serradesanferm R, Serat-Serrat J, Serra-Grima JR, González-Sastre F, Ordonéz-Llanos J et al.. Increase of LDL susceptibility to oxidation occurring after intense, long duration aerobic exercise. Atherosclerosis, 1995, 118 : 297- .
  35. Cooper Ce, Vollaard NB, Choueiri T, Wilson MT. Exercise, free radicals and oxidative stress. Biochem Soc Trans, 2002, 30(2) : 280-285.
  36. Banerjee AK, Mandal A, Chanda D, Chakraborti S. Oxidant, antioxidant and physical exercise. Mol Cell Biochem, 2003, 253(1-2) : 307-312.
  37. Santos-Silva A, Rebelo I, Castro EMB, Belo L, Guerra A, Rego C, Quintanilha A. Leukocyte activation, erythrocyte damage, lipid profile and oxidative stress imposed by high competition physical exercise in adolescents. Clin Chim Acta, 2001, 306:119-126.
  38. Santos-Silva A, Rebelo I, Castro EMB, Belo L, Catarino C, Monteiro I, Almeida MD, Quintanilha A. Erythrocyte damage and leukocyte activation in ischemic stroke. Clin Chim Acta, 2002, 320:29-35.
  39. Levenson J, Del-Pino M, Simon A. Blood and arterial wall rheology and cardiovascular risk factors. J Mal Vasc, 2000, 25(4):237-240.
  40. Connor J, Pak CC, Schroit AJ. Exposure of phosphatidylserine in the outer leaflet of human red blood cells. Relationship to cell density, cell age, and clearance by mononuclear cells. J Biol Chem, 1994, 269(4):2399-2404.

© Está  expresamente prohibida la redistribución y la redifusión de todo o parte de los  contenidos de la Sociedad Iberoamericana de Información Científica (SIIC) S.A. sin  previo y expreso consentimiento de SIIC
anterior.gif (1015 bytes)

Bienvenidos a siicsalud
Acerca de SIIC Estructura de SIIC


Sociedad Iberoamericana de Información Científica (SIIC)
Mensajes a SIIC

Copyright siicsalud© 1997-2024, Sociedad Iberoamericana de Información Científica(SIIC)