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CONSEQUÊNCIAS DA PRIVAÇÃO DE SONO EM ESTUDANTES TRABALHADORES
(especial para SIIC © Derechos reservados)
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Autor:
Liliane Teixeira
Columnista Experto de SIIC

Artículos publicados por Liliane Teixeira 
Coautores Arne Lowden* Claudia Roberta Moreno** Samantha Turte** Roberta Nagai** Maria do Rosário Latorre** Frida Marina Fischer** 
Estocolmo, Suecia*
São Paulo, Brasil**


Recepción del artículo: 14 de diciembre, 2006
Aprobación: 22 de febrero, 2007
Conclusión breve
A dupla jornada (trabalhar e estudar) e a privação de sono acabam levando ao aumento da sonolência diurna para os estudantes trabalhadores, podendo prejudicar o desenvolvimento físico e mental, característicos da juventude.

Resumen

O objetivo deste estudo foi avaliar e comparar os padrões de sonolência ao longo do dia, em estudantes trabalhadores e não-trabalhadores. A população estudada compreendeu estudantes entre 14 e 21 anos, trabalhadores e não-trabalhadores, alunos do ensino médio do período noturno. Os estudantes preencheram um questionário de caracterização das condições de vida, saúde, sono e trabalho e responderam à escala de sonolência Karolinska. As variáveis foram testadas através da ANOVA para três fatores (dia da semana, horário e trabalho). Verificamos que os estudantes trabalhadores referiram estar mais sonolentos que os estudantes não-trabalhadores no primeiro e no último registro diário. A sonolência registrada também foi maior na segunda-feira após o almoço, na quarta-feira durante as aulas e na sexta-feira antes de dormir comparados os demais dias e horários. Os padrões de sonolência de estudantes trabalhadores são ligeiramente maiores no período noturno quando comparados com os estudantes não-trabalhadores. Provavelmente, o aumento da sonolência no período escolar deve estar relacionado aos efeitos da dupla jornada (trabalhar e estudar) e da redução na duração do sono. Esses fatores podem levar ao aumento da sonolência no início e final do dia para os estudantes trabalhadores, interferir no rendimento escolar e prejudicar o desenvolvimento físico e mental, característicos da adolescência.

Palabras clave
estudantes, estudiantes, estudantes trabalhadores, sonolência, estudiantes trabajadores, somnolencia

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/87290

Especialidades
Principal: Medicina Interna
Relacionadas: Atención PrimariaBioquímicaEducación MédicaMedicina del TrabajoMedicina FamiliarNeurologíaPediatríaSalud Mental

Enviar correspondencia a:
Frida Marina Fischer, Departamento de Saúde Ambiental, Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, 01246-904, São Paulo, Brasil


Effects of Sleep Deprivation on Working Students

Abstract
The aim of this study was to evaluate patterns of sleepiness, comparing working and non-working students. The study was conducted on high school students attending evening classes (19:00-22:30 h), at a public school in São Paulo, Brazil. The study group consisted of working (n = 51) and non-working (n = 41) students, aged 14-21. The students answered a questionnaire about working and living conditions, reported health symptoms and diseases. During seven consecutive days sleepiness ratings were given six times per day, including upon waking and at bedtime using the Karolinska Sleepiness Scale - KSS. Statistical analyses included three-way ANOVA and t-test. Working students were moderately sleepier than non-workers along the week and also during class on specific days: Mondays (13:00-15:00 h), Wednesdays (19:00-22:00h), and Fridays (22:00-00:59h). It was observed that workers had moderately higher daytime sleepiness in the evening compared to non-workers. This might be due to a work effect, reducing the available time for sleep, and thus, shortening sleep duration. Sleepiness and shorter sleep duration can have a negative impact on the quality of life and school development of high school students.


Key words
adolescents, young workers, sleepiness


CONSEQUÊNCIAS DA PRIVAÇÃO DE SONO EM ESTUDANTES TRABALHADORES

(especial para SIIC © Derechos reservados)
Artículo completo
Introdução

O ciclo vigília-sono é um ritmo biológico cuja expressão não é rígida, pois tende a se alterar de acordo com as informações provenientes do meio interno e externo. As imposições sociais, como estudar e trabalhar, são importantes fatores que podem conduzir a modificações dramáticas nos padrões de sono.

Carskadon1 relata que principalmente os jovens americanos e de classe sócio-econômica elevada, estão sendo seduzidos pela televisão, internet, telefones celulares, vídeo games e o uso de diversos tipos de substâncias estimulantes e depressores do sono (cafeína, álcool, nicotina, energéticos, etc.). Estes fatores associados à falsa idéia de que a redução na duração de sono é igual a maior tempo livre, faz com que os adolescentes consigam permanecer acordados por mais tempo, e assim possam realizar muitas atividades, em vez de ir dormir. Maior estimulação, menor duração de sono, atraso no horário de dormir, atraso no horário de acordar durante os fins-de-semana, maior tempo livre, etc., são fatores que levam à irregularidades no ciclo vigília-sono dos jovens.

É característico na adolescência e juventude observar-se uma tendência à diminuição da duração do sono noturno nos dias de semana, com um concomitante aumento da incidência da sonolência diurna, da dificuldade em despertar pela manhã e de problemas relacionados com o adormecer à noite.1,2

O trabalho do adolescente pode ser responsável, pelo menos em parte, pela sonolência durante o trabalho e nas aulas, levando à diminuição no tempo utilizado para realizar as tarefas escolares e atividades físicas, maior incidência de uso de substâncias estimulantes e de bebidas alcoólicas, e pela percepção de cansaço crônico.3,4

Devido à complexidade dos fatores sociais envolvidos no ciclo vigília-sono e na percepção da sonolência em jovens, o objetivo deste estudo foi avaliar e comparar os padrões de sonolência ao longo do dia em estudantes trabalhadores e não-trabalhadores.


Metodologia

População

Participaram da pesquisa estudantes entre 14 e 21 anos de idade incompletos, alunos do Ensino Médio, período noturno (19.00-22.30 h), que freqüentavam uma escola pública no município de São Paulo, SP, Brasil. Todos os estudantes entre 14 e 21 anos de idade foram convidados a participar como voluntários da pesquisa. Segundo Breinbauer5 os jovens incluem-se nesta faixa etária.

Os estudantes foram contatados pessoalmente e leram o Termo de Consentimento pós-informação. Todos aceitaram participar voluntariamente do estudo, preenchendo e assinando o documento. Os voluntários menores de 18 anos de idade levaram o termo de consentimento para ser assinado também pelo responsável. O Termo de Consentimento foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.6


Critérios de seleção

Para obter-se o grupo de estudantes trabalhadores, foi utilizado o mesmo critério utilizado por Fischer3,7 em estudos anteriores: “trabalho é toda atividade sistemática em que há uma obrigatoriedade de desenvolver tarefas, em horários e períodos pré-determinados, seja no ambiente doméstico, seja para terceiros, com ou sem remuneração, tendo ou não vínculo empregatício formalizado”.

Para o grupo de alunos trabalhadores, foram selecionados para a pesquisa alunos com horários e duração de trabalho semelhantes (em torno de 40 horas semanais). Isto se deveu para minimizar diferenças nas análises dos horários de acordar, ou mesmo na quantidade de horas trabalhadas diariamente e semanalmente entre os alunos.

Para o grupo de alunos não-trabalhadores, foram considerados aqueles que registraram no questionário que nunca trabalharam ou que estavam desempregados. Este critério baseou-se no estudo de Fischer et al 3, que verificaram semelhanças entre as médias de duração do sono referidas por estudantes desempregados e não-trabalhadores.

Foram excluídos da amostra dois estudantes: um estava tomando medicamentos que interferia no ciclo vigília-sono, e outro que relatou distúrbios de sono no questionário de avaliação dos distúrbios do sono.8


Tamanho da amostra

Devido à ausência na literatura de estudos a respeito da sonolência em estudantes trabalhadores, foi realizada uma pré-coleta em 2002, com estudantes da 3ª série do Ensino Médio do período noturno, na mesma escola onde este estudo foi conduzido. Com estes resultados, o tamanho da amostra foi calculado a partir da média e dos desvios-padrão dos níveis de sonolência dos estudantes trabalhadores e não-trabalhadores. Numa escala de 1 (muito alerta) a 9 (muito sonolento), a média dos níveis de sonolência para os estudantes trabalhadores foi 4.55 e para os não-trabalhadores, 4.18 e o desvio-padrão para todos os estudantes foi 0.46. Utilizando a tabela para comparação entre duas médias,9 α = 5%, β = 10% e T = 0.80, o tamanho da amostra seria de 33 estudantes por grupo de estudo (trabalhadores e não-trabalhadores).


Perdas na amostra

A coleta de dados iniciou-se em agosto de 2002 e terminou em junho de 2004. Não ocorreu coleta de dados nos períodos de férias e nas semanas em que havia algum feriado. O tempo de coleta (24 meses) deveu-se a: às baixas taxas de resposta e de colaboração dos estudantes e as substanciais perdas de seguimento dos participantes. Após praticamente dois anos de coleta de dados, e por não conseguir mais voluntários, decidiu-se encerrar a coleta de dados. Assim, o grupo dos estudantes trabalhadores contém 51 estudantes e o grupo dos não-trabalhadores contém 41 estudantes. Mesmo ultrapassando o tamanho da amostra estabelecido (33 estudantes por grupo), o maior número de perdas ocorreu no grupo dos estudantes não-trabalhadores. Estes, por ainda não estarem inseridos no mercado de trabalho, aparentemente sentiram-se menos motivados a participar deste estudo.


Questionário de Caracterização das Condições de Vida, Saúde, Sono e Trabalho

Com este protocolo foram obtidas informações a respeito da idade, sexo, cursos e atividades extracurriculares, hábitos de fumo e álcool, atividades físicas e outras atividades no tempo livre, condições de saúde, local de trabalho, função exercida, registro em carteira de trabalho e salário. Neste questionário foi incluído o questionário de avaliação dos distúrbios do sono, validado por Braz.8


Escala de sonolência Karolinska

Nesta escala o indivíduo circulava o valor que entendia como melhor no momento, precedida da pergunta “Como você está se sentindo agora?” A escala contém 9 pontos: muito alerta (1); alerta (3); nem alerta, nem sonolento (5); sonolento, mas consegue ficar acordado (7) e muito sonolento, brigando com o sono, muito esforço para ficar acordado (9). Os outros pontos da escala (2, 4, 6 e 8) não possuem texto explicativo. Cada página representa uma avaliação durante um dos momentos do ciclo vigília-sono. A auto-avaliação da percepção do alerta foi realizada ao acordar, a cada três horas e antes de dormir, durante a fase de vigília, por 7 dias consecutivos.9


Análise estatística

Os dados obtidos foram submetidos inicialmente à estatística descritiva (porcentagem, média e erro-padrão). Os padrões de sonolência entre trabalhadores e não-trabalhadores passaram por teste de normalidade (Shapiro-Wilk test). Foi utilizada a análise de variância (ANOVA) de 3 fatores nas comparações de médias entre grupo de trabalhadores e não-trabalhadores, dia da semana e horário 7-9 h, 10-12 h, 13-15 h, 16-18 h, 19-21 h e 22-24 h. Os seis períodos de sonolência foram escolhidos por conterem uma marcação de cada estudante por período. Foram feitas múltiplas comparações utilizando a correção de Tukey-HSD (“honest significant diferences”). Em todas as análises foi considerado o nível de significância α = 5%. Foram utilizados os programas SPSS 12.0.


Resultados

Descrição da população estudada

A Tabela 1 apresenta as características sócio-demográficas e estilos de vida. Não foram encontradas entre estudantes trabalhadores e não-trabalhadores, diferenças significantes em relação ao: sexo, faixa etária, série, duração das atividades extracurriculares, hábito de fumar, consumo diário de cafeína e teobromina, duração da atividade física semanal e duração do lazer semanal.

Com relação ao hábito de fumar e beber, aproximadamente 70% dos estudantes referiram não fumar e 35% não beber. Para os estudantes que referiram beber, o consumo médio diário de álcool foi 0.42 g/kg (S.E. = 0.09 g/kg). As estudantes do sexo feminino não-trabalhadoras relataram o maior consumo diário de álcool (0.77 g/kg; S.E. = 0.25 g/kg) quando comparadas com as estudantes femininas trabalhadoras (média = 0.63 g/kg; S.E. = 0.22 g/kg; p = < 0.01), estudantes do sexo masculino trabalhadores (média = 0.48 g/kg; S.E. = 0.20 g/kg; p = 0.02); e não-trabalhadores (média = 0.58 g/kg; S.E. = 0.24 g/kg); p = 0.02).


Tabela 1

Padrões de sonolência (KSS)

A tabela 2 mostra a média e o erro-padrão da sonolência coletada a cada 3 horas, durante uma semana, pelos estudantes trabalhadores e não-trabalhadores.

Os padrões de sonolência de estudantes trabalhadores são diferentes dos estudantes não-trabalhadores. Na análise de variância utilizando os fatores grupo (estudantes trabalhadores e não-trabalhadores), dia da semana e horário, foi significante o fator dia (4.14; p < 0.01). A interação do horário e dia (F = 5.80; p < 0.01) e grupo, horário e dia (4.31; p < 0.01) também foram significantes (Tabela 3).

Utilizando o teste de Tukey verificamos que os estudantes trabalhadores eram mais sonolentos que os estudantes não-trabalhadores no início (7-9 h) e no fim do dia (22-24 h) (p = 0.05). Os estudantes trabalhadores eram mais sonolentos que estudantes não-trabalhadores também na segunda-feira após o almoço (13-15 h), na quarta-feira durante as aulas (19-21 h) e na sexta-feira antes de dormir (22-24 h). Aos domingos, entre 22-24 h foi encontrado o maior nível de sonolência entre os estudantes trabalhadores. Também, neste momento, os trabalhadores eram mais sonolentos que os estudantes não-trabalhadores (p < 0.01). Não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos utilizando o sexo e idade como covariáveis.

É importante salientar que o número de observações nos períodos 7-9 h e 22-24 h são reduzidos devido ao fato que aproximadamente 30% dos estudantes estavam dormindo nesses momentos. O maior número de respostas no início do dia (7-9 h) refere-se aos estudantes trabalhadores, e no fim do dia (22-24 h) aos estudantes não-trabalhadores.








Tabela 2. Média e erro-padrão da escala de sonolência para todos os dias da semana e horários. Trabalhadores e não-trabalhadores, Ensino Médio. São Paulo, SP.










Tabela 3. Análise de variância com três fatores, para as marcações a cada três horas da Escala de Sonolência Karolinska, durante uma semana.




Discussão

O desenvolvimento da sonolência nos grupos estudados parece seguir um padrão regulado pelo aumento da necessidade de sono e o ciclo circadiano.11 O padrão em forma de “U” da sonolência para todos os dias estudados, aparentemente é marcado pela influência circadiana. O rápido aumento da sonolência no período noturno demonstra a necessidade do sono e de acordo com nossos resultados, uma redução do sono entre os adolescentes trabalhadores.12 A sonolência coletada em diversos dias da semana também demonstra um pico adicional no período da tarde (“post-lunch dip”), que possivelmente reflete a queda da temperatura corporal após o almoço.13 Mas na vida real, as medidas de sonolência podem ser reduzidas devido à grande possibilidade dos sujeitos usarem substâncias que alteram a condição de alerta, como o consumo de café ou então realizar esforço físico.14 A sonolência pode variar de acordo com as características individuais, como por exemplo, em indivíduos com insônia ou hipersonia, fatores ambientais e genéticos.15,16

Na segunda-feira, o aumento da sonolência entre trabalhadores está provavelmente associado com as mudanças nos horários de dormir e acordar do fim-de-semana. O estudante trabalhador dedica este período para as atividades extracurriculares (cursos de inglês e computação) principalmente aos sábados, porque essas atividades não eram bem desenvolvidas nas escolas públicas. Além disso, a prática de atividades físicas e a socialização são concentradas nos fins-de-semana.17 Isto pode ser explicado por dois fatores: a) os adolescentes não-trabalhadores podem ter menor pressão temporal, expressando o atraso de fase característico da puberdade;18 b) os adolescentes trabalhadores vão para cama logo que chegam a suas residências, porque precisam acordar cedo no dia seguinte para ir trabalhar. Portanto, a fadiga devido à dupla jornada – trabalhar e estudar associada à sonolência, pode mascarar o atraso de fase característico da puberdade.

Indivíduos submetidos a horários de trabalho ou horários escolares mais rígidos tenderiam a expressar ritmos com características mais semelhantes.19 Neste estudo os estudantes trabalhadores possuem um ciclo vigília-sono regular quando comparados com os estudantes não-trabalhadores. Os trabalhadores têm uma redução do sono durante todos os dias escolares (cerca de duas horas por dia) quando comparados com os não-trabalhadores. Na revisão feita por Gillberg,20 foi observado que uma redução de 2-4 horas por dia na duração do sono noturno reduz o nível de alerta e tem efeito acumulativo. Neste estudo, o efeito acumulativo da privação de sono, entre estudantes trabalhadores, pode ser verificado em todos os dias da semana. Isto poderia explicar as diferenças encontradas nos padrões de sono dos fins-de-semana, onde adolescentes trabalhadores sentem sono mais cedo quando comparados com não-trabalhadores, adiantando o horário de dormir. Além disso, indivíduos submetidos à crônica privação de sono, podem não perceber o quão sonolentos se encontram, sentindo dificuldades para expressar seus padrões de sonolência.21.22


Sonolência durante as aulas

Neste estudo foi verificado que mesmo havendo uma grande diferença na duração média do sono durante os dias da semana, somente na quarta-feira durante as aulas (19-21 h) os adolescentes trabalhadores são mais sonolentos que os não-trabalhadores. Em trabalhos anteriores23 observaram que 2 horas de redução na duração do sono noturno de adolescentes entre 14 e 18 anos aumentam os níveis de sonolência durante as aulas e reduzem a percepção do alerta em 32% dos adolescentes. Uma das possíveis explicações para os resultados obtidos neste estudo é o curto período de tempo na escola. Os adolescentes trabalhadores permaneciam na escola por menor tempo quando comparados com os não-trabalhadores. Em média, os trabalhadores permaneciam na escola por 2.78 horas em média por dia e os não-trabalhadores 3.37 horas por dia.24 Normalmente, os trabalhadores chegavam tarde na primeira aula (19 h) e só podiam entrar na escola poucos minutos antes da segunda aula começar (19.50 h). Às 20.30 h, todos os estudantes iam para o intervalo e retornavam a classe às 21 h. Muitas vezes, um dos professores faltava e os estudantes iam para casa antes do término das aulas (22.30 h).

Sonolência e fadiga são inevitáveis conseqüências da privação de sono.25 São freqüentemente manifestadas através do despertar tardio ou muito cedo, cansaço, cochilos durante as aulas e dificuldades no aprendizado. Desta maneira, estudantes sonolentos ou fatigados provavelmente serão os últimos a tomarem iniciativas quando participarem em tarefas em grupo.26 Ainda que um adolescente trabalhador não cochile durante as aulas, ele pode experimentar breves lapsos de memória.

Ao se pensar em novos estudos sobre a sonolência, é importante considerar atividades extracurriculares, assim como as atividades sociais. As relações existentes entre o trabalho, a escola, a privação de sono e a sonolência diurna são assuntos de grande interesse para professores, pedagogos e outros profissionais envolvidos na educação. A dupla jornada para adolescentes trabalhadores pode dificultar a ida à escola e a permanência em todas as aulas. A queixa mais comum manifestada por educadores e especialistas na área de saúde do trabalhador sobre adolescentes trabalhadores envolve problemas associados com o aprendizado escolar, baixo desempenho, perda de concentração, alerta e atenção.27 Provavelmente, esses problemas são agravados pela privação de sono. Outros problemas enfrentados pelos adolescentes trabalhadores que estudam à noite são: a incapacidade de estudar fora do horário escolar, faltar às aulas freqüentemente e a evasão escolar, quando comparados aos estudantes não-trabalhadores.7

Apesar das conseqüências da privação de sono sobre a sonolência diurna já terem sido bastante investigadas,28 poucos são os estudos que mostram conseqüências sobre o desempenho escolar. Essa dificuldade se deve ao fato de existirem muitas variáveis que podem influenciar o desempenho e que dificultam a análise dos dados, principalmente quando os estudos são realizados em pequenas populações.

Allen29 ao analisar estudantes do Ensino Médio que trabalhavam e Giannotti et al30 ao analisarem estudantes italianos entre 14-20 anos de idade verificaram que as atividades escolares eram prejudicadas quando os estudantes dormiam menos e possuíam irregularidade nos horários de dormir. Esses fatores diminuíam o alerta e aumentavam a sonolência durante as aulas. No presente estudo observaram-se diferenças entre os grupos de trabalhadores e não-trabalhadores com relação à duração de sono e regularidade nos horários de dormir e acordar. Os trabalhadores tinham menor duração do sono e regularidade nos horários de dormir e acordar, ocorrendo o oposto com os não-trabalhadores. Portanto, esses resultados podem indicar que os dois grupos podem ter um baixo rendimento escolar.

Nas hipóteses iniciais ao delinear esse estudo, o trabalho exerceria um papel central nas repercussões do ciclo vigília-sono e conseqüentemente levaria ao aumento da sonolência diurna. Foi uma surpresa verificar que os relatos de sonolência excessiva não se mostraram tão prevalentes como se esperava que fossem. Após as análises verificamos que o trabalho não é o único fator que leva à sonolência diurna. Outros fatores contribuem para a ocorrência da sonolência, o que nos demonstra a complexidade do fenômeno e a complexidade nos processos de intervenção.


Limitações do estudo

Neste estudo foram coletados dados de estudantes de uma única escola pública da cidade de São Paulo. Essa escola possui características sócio-demográficas que podem diferir de outras escolas públicas. Portanto, não se pode esquecer, que os resultados deste estudo, devem ser interpretados apenas para populações da escola analisada. Além disso, esse estudo é do tipo transversal, o qual não permite avaliar a ordem temporal ocorrida entre a sonolência e as outras variáveis estudadas, excluindo-se qualquer inferência causal.

O viés de seleção pode ter ocorrido quando selecionamos indivíduos saudáveis para participarem do estudo. Os sujeitos podem não ter relatado que tinham distúrbios de sono (não detectados pelo questionário de distúrbio de sono e actímetro) e/ou morbidades, como por exemplo, problemas respiratórios, que alteram o ciclo vigília-sono, levando a sonolência diurna. Também não sabemos se indivíduos com distúrbios de sono abandonaram a escola.

Uma outra limitação deste estudo refere-se à possível interferência ao longo das coletas de dados. Os dados de sonolência foram coletados em 2002, 2003 e 2004 e foram comparados seus níveis médios. Não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos, mas não se pode excluir que tenha havido nas respostas aos protocolos, interferências pela influência dos estudantes com seus colegas que já haviam participado deste estudo.


Conclusão

Os padrões de sonolência de estudantes trabalhadores são ligeiramente maiores no período noturno quando comparados com os estudantes não-trabalhadores. Provavelmente, o aumento da sonolência no período escolar deve estar relacionado aos efeitos da dupla jornada (trabalhar e estudar) e da redução na duração do sono. Esses fatores podem levar ao aumento da sonolência no início e fim do dia para os estudantes trabalhadores, interferir no rendimento escolar e prejudicar o desenvolvimento físico e mental, característicos da adolescência.
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